Com o tempo vem a noção de perspectivas diferentes. Não é só o tempo de crescimento. Ou todos os tempos de crescimento. O da idade, que o tempo impõe. O de dentro, que nos fazemos.
Em nuances não adivinhadas havia limites impostos, poucos, sem controlo, mas eficazes. Lembro-me de me ouvir gritarem, poços. Numa terra onde água sinonimava poço, com mais ou menos muro, quantos sem, ou tão baixos que era o mesmo, andar livre, correr, poços e terra recorrentes, a palavra poço marcava vida, marcava morte, no reflexo da água o céu, azul, nuvens, eu, e os fantasmas de todos os afogados.
Na casa da tia Lucinda o poço estava à porta da cozinha. Descidos os degraus, dois, balde atirado, a queda ao fundo, o splahsh na água, tentativa de boiar, os ferros de peso, tombava de lado, golfinhava-se de água, força na corda, força, a corda rija, força, a água ali. Na casa da Avó o poço estava longe. A água buscava-se na fonte, pública, ao fundo da ladeira, maldita quando subida a vasilha cheia.
- Ah nino, a talha está quase vazia, vais acartar umas infusas dauga, sim?
Adivinhava-se o corpo dorido. Caretas para dentro escapavam para fora.
Oh Vó... Suspiro. Nunca se dizia não.
Pedro